Os irmãos Jean-Pierre e Luc Dardenne demonstram em A Criança mais do que uma afinidade temática com os assuntos envolvendo a infância, tema já desenvolvido desde o filme anterior, O Filho. Há nesses dois filmes um cinema marcado pela busca de um realismo transformador.
Em ambos os filmes, o que está figurado é uma trama aparentemente normal. O que eles têm a propor não é uma trama engenhosa com quebras de expectativa. A intenção dos filmes é destacar um evento trágico, mas sem grandes surpresas, acompanhando-o com um realismo que abusa das câmeras de mão e dos enquadramentos fechados nos personagens. Há nesse processo uma asfixia realista, pois é notório o abuso dos detalhes no acompanhamento da tragédia. Em O Filho, acompanha-se a viagem do garoto assassino com o pai da sua vítima com incomum exaustão. Em A Criança, faz-se repetidas viagens de ônibus com o pai e seu filho recém nascido que seriam facilmente suprimidas em qualquer outro filme.
Na narrativa, o que se processa é uma desanaturalição de um trama urbano típico, diariamente observado nos noticiários. Em O Filho, o menor de idade assassino. Em A criança, a venda para a adoção de um filho pelo pai. Importante nessas tramas é a desbanalização que é realizada por essa opção de narrar a exaustão os episódios, com enorme proximidade. Em ambos, os diretores geram uma transformação nos personagens e também promovem uma mudança da imagem pública banalizada desses espisódios. O pai do filho assassinado, com a proximidade do assassino (também uma criança), não realiza vingança, ao contrário, percebe-se a complexidade do problema e nada adiantaria uma reação vingativa. No filme de 2005, o pai do bebê - depois de quase concretizar a venda de seu próprio filho - estanca sua vida de comercialização acima de qualquer limite e entegra-se para a polícia para não complicar o seu comparça, uma criança, assim como será seu filho.
Não há finais conclusivos. O recado deles parece ser sucinto e complexo, assim como seus filmes. Os dramas cotidianos não são tão simples e banais como parecem (ou aparecem nas notícias). O que não significa que os diretores tenham solução para eles. Não dar final conclusivo aos filmes com essas temáticas tão trágicas talvez seja um ato de justeza e sinceridade, reconhecendo que o cinema tem o seu limite, que para esses autores é bastante claro: mostrar a complexidade, violência e desordem que o nosso mundo se encontra, mas a partir daí, o cinema não pode fazer muito, pois já cumpriu a sua função.
2 comentários:
Achei realmente uma pena não haver comentários quanto a esse filme. Uma ótima citação sua é que o filme trata do cotidiano o que já extremamente complexo e não cru como as noticias mostram hoje em dia de maneira banal e desenfreada.
Os Dardenne fazem um Cinema da imcompletude que pra mim é o que de mais respeitoso pode ser feito por um espectador. Há espaço, há lugar pra se respirar, pensar, criar.O cinema dos Dardenne, assim como o melhor cinema, é respiração.
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