O filme Do Outro Lado, de Fatih Akin, é um filme sobre exílios. Não só sobre os exílios clássicos, oriundos das repressões estatais mais expressas, mas também de exílios forjados em novas violências e crises menos nítidas. A globalização, filha querida do mundo nascido após a queda do muro de Berlim, ao contrário do que muitos pensam, não acabou com os exílios. Talvez o Estado repressor onipontente (do século XX) tenha apenas perdido o monópolio sobre a capacidade de cercear a liberdade dos seres humanos. Todavia, o filme é interessante ao mostrar quão longe estamos da liberdade, seja na Alemanha – os ricos da sociedade global – ou na Turquia – o campo de mutilados pela globalização.
O filme está estruturado em grupos de personagens que têm suas histórias entrelaçadas, embora nunca se encontrem de fato. Difícil – e talvez indevido - é reconstituir toda a trajetória desses grupos. Este é um daqueles filmes que retiram rapidamente os impacientes da sala. Em boa parte das duas horas de filme, é necessário guardar algumas peças que só serão juntadas ao longo do filme. Algumas dessas peças ficarão mesmo sem uma resposta definitiva.
Durante a montagem do quebra-cabeças, somos convidados a recusar o maniqueísmo ao tratar dos conflitos envolvendo a imigração turca na Alemanha. No filme, nem os imigrantes turcos são santos e coitadinhos, tampouco o alemão “genuíno” é realizado e feliz. Nem por isso pode-se pensar que turcos e alemães têm sinas iguais na Alemanha e fora dela. Aos desavisados, o filme alerta que alguns sangues valem mais do que outros, apesar da eugenia nazista ter sido derrotada há algumas décadas.
O quebra-cabeças também cumpre o papel de fazer o espectador sentir-se parte desse mundo de desencontros, onde tudo parece tão mais fácil e próximo, ainda que não esteja acessível a todos. Familiares perdidos, revoluções socialistas e estados totalitários, vidas descartáveis, fome e remorso parecem ser fatores que se mesclam nesse ponto de contato entre a Alemanha e a Turquia, tão esclarecedor da catástrofe escondida atrás da aparente felicidade da União Européia.
Por ser um filme mais de perguntas do que de respostas, fica aquela sensação curiosa produzida pelos bons filmes: paramos um pouco de viver a nossa trama, a nossa ficção, e vamos ao cinema ouvir e ver a vida dos outros, confiantes de que, ao fazer isso, estamos voltando mais experientes e com mais dúvidas para aquela nossa trama que deixamos de lado durante o filme. O filme bom é aquele que cumpre bem a travessia entre aquilo que sobrou da vida de um outro (desconhecido) e aquilo que nos faltava quando decidimos parar a nossa trama pessoal e entrar no cinema.
O filme está estruturado em grupos de personagens que têm suas histórias entrelaçadas, embora nunca se encontrem de fato. Difícil – e talvez indevido - é reconstituir toda a trajetória desses grupos. Este é um daqueles filmes que retiram rapidamente os impacientes da sala. Em boa parte das duas horas de filme, é necessário guardar algumas peças que só serão juntadas ao longo do filme. Algumas dessas peças ficarão mesmo sem uma resposta definitiva.
Durante a montagem do quebra-cabeças, somos convidados a recusar o maniqueísmo ao tratar dos conflitos envolvendo a imigração turca na Alemanha. No filme, nem os imigrantes turcos são santos e coitadinhos, tampouco o alemão “genuíno” é realizado e feliz. Nem por isso pode-se pensar que turcos e alemães têm sinas iguais na Alemanha e fora dela. Aos desavisados, o filme alerta que alguns sangues valem mais do que outros, apesar da eugenia nazista ter sido derrotada há algumas décadas.
O quebra-cabeças também cumpre o papel de fazer o espectador sentir-se parte desse mundo de desencontros, onde tudo parece tão mais fácil e próximo, ainda que não esteja acessível a todos. Familiares perdidos, revoluções socialistas e estados totalitários, vidas descartáveis, fome e remorso parecem ser fatores que se mesclam nesse ponto de contato entre a Alemanha e a Turquia, tão esclarecedor da catástrofe escondida atrás da aparente felicidade da União Européia.
Por ser um filme mais de perguntas do que de respostas, fica aquela sensação curiosa produzida pelos bons filmes: paramos um pouco de viver a nossa trama, a nossa ficção, e vamos ao cinema ouvir e ver a vida dos outros, confiantes de que, ao fazer isso, estamos voltando mais experientes e com mais dúvidas para aquela nossa trama que deixamos de lado durante o filme. O filme bom é aquele que cumpre bem a travessia entre aquilo que sobrou da vida de um outro (desconhecido) e aquilo que nos faltava quando decidimos parar a nossa trama pessoal e entrar no cinema.
2 comentários:
Assisti ao filme com uma semelhança muito grande, do que foi explanada ao longo do belo texto que o Thiago construiu. Creio com certeza que esse exílio na qual se inserem os 6 personagens da trama, é o resultado de uma percepção de mundo que prega um sistema sem barreiras, contudo se contradiz impondo barreiras implícitas e explícitas, tão bem retratadas do filme do promissor e competente Fatih Akin.
A origem de Akin reforça ainda mais um prisma cosmopolita ao analisar os encontros e desencontros de seus personagens, ao passo que os mesmos estão tão perto, quanto na medida em que estão longe. A política de relações exteriores da União Européia também é discutida tendo os cenários da moderna Bremen e a dicotômica Istambul, como ponte entre o progresso ocidental e o pragmatísmo oriental.
Belo texto, boa direção e roteiro, ótimo filme.
Ah, sim, ler este texto ampliou a visão que tive do filme, quando o assisti na ocasião da Mostra aqui em Sampa. Posso voltar a vê-lo na telona, agora com outras leituras possíveis.
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