25 de mar. de 2007

Ir ao cinema do Centro Cultural São Paulo não é só ir ao cinema...

As sessões de cinema do Centro Cultural São Paulo(CCSP) têm a curiosa peculiaridade de fornecer sempre - pelo menos no meu caso - uma experiência de choque com as exibições silenciosas, calmas e respeitosas, normalmente vistas nos demais cinemas. Ao descer a escada que dá acesso à sala já me pergunto "o que será desta vez?" e, antes de adentrar este lugar controverso, preparo-me para uma experiência marcante, dentro e fora das telas.

A primeira vez que isso ocorreu - e eu ainda não sabia que isso era a regra da "casa" - foi na exibição de "O Caso dos Irmãos Naves". Filmado em Araguari-MG, o filme começa com as imagens de uma estação de trem, dessas que não existem mais para transportar pessoas. Nessas imagens, começam gritos e comentários altos e descontraídos "Ah! Isso é Santa Rita". "Eu já fui aí" e os risos e cochichos prosseguem. O sumiço do devedor dos irmãos Naves é outro momento de inquietação: "Esse não volta mais!", "Ihh... morreu!", "Já vi isso acontecer" e novamente a sala se agita entre os narradores do filme e os incomodados - normalmente freqüentadores de salas silenciosas e pagas onde o silêncio casa com a apatia e indiferença, pilares menos orgulhosos das sociedades prosperas.

Mas os narradores perdem a graça. As torturas aos irmãos Naves e os momentos de brutal violência são visto com animação por eles que lançam frases de apoio ao delegado torturador: "pega ele! Isso!" ou "Aí! Essa doeu!(risos)". Param os pedidos de silêncio, não sei se frente à estupefação geral dos modernos frente àquele cenário de rinha de galo implantado pelos mais emotivos ou porque já nessa altura ninguém esperava conseguir o tal silêncio. Estava no segundo caso e, frente à derrota, parti para assistir aos dois espetáculos e acompanhar os comentários - menos eruditos, mas muito interessantes - dos que insistiam num cinema narrado, meio futebolizado.

Os primeiros gritos de excitação com a violência da tortura foram substituídos, ao longo do filme, por um silêncio meio engasgado ao passo que o filme desenvolvia melhor a via crucis dos irmãos Naves. Quem os calou foi o filme, colocando-os num dilema moral em relação a primeira reação sádica dos exaltados. O silêncio era provavelmente a digestão da trama, momento em que a tortura se consolida e fica mais clara a posição de vítimas dos irmãos.

Depois da digestão, os narradores quebram o silêncio com os primeiros gritos de torcida pelos irmãos Naves e suas pequenas vitórias. Mesmo que tenham saído da posição de algoz para a das vítimas, os narradores saem calados porque não tiveram o que comemorar. O filme hoje era de um grito abafado pela violência. Os espectadores mais exaltados sabiam muito bem o que era isso. Os modernos viram um silêncio mais qualificado, imposto pelo filme e não pela indiferença com o que se vê.

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