Cão Sem Dono
Cão sem dono, filme baseado no livro "Até o dia em que o cão morreu", aproxima a filmografia de Beto Brant de temas "recentemente contemporâneos". Essa aproximação é louvável, em certa medida por ela mesma, uma vez que se alargam os limites da representação cinematográfica. Mas ser atual, se aproximar de questões ainda pouco tratadas, não basta. Mas, seja como for, o filme tem seu mérito pelo fato de, quem sabe, ter inaugurado um cinema que se aproxima como nenhum outro os conflitos de um mundo contermporâneo muito bem delineado pelo livro quando o narrador diz: "Velho em certo sentido. No sentido de que era tarde demais para morrer jovem".
Cravado por um mundo sem transcendência, num claro contraponto ao cinema brasileiro cheio de utopia, cujo símbolo máximo é Glauber Rocha, o filme parece não conseguir ser fiel à reflexão profunda decorrente do livro de Galera. Muito fiel à trama do livro, o filme se perde numa história que era apenas um dos alicerces - e talvez um dos mais frágeis - para a reflexão de fundo existencial presente no livro.
Filme cheio de FADE OUTs, que parecem cortar o filme em cenas que mais parecem bifes que se avolumam sem gerarem um aprofundamento da narrativa. As recorrentes quebras parecem evitar tocar na ferida do terrível vazio e morbidez da personagem Marcela, numa espécie de complacência. Personagem que tem interpretação complicada, já que a atriz - namorada do autor do livro, o que cheira a amadorismo tupiniquim - parece mais ser a personagem do que interpretar a personagem, o que é não é uma diferença pouco considerável. As quebras também intercalam momentos de humor que demonstram uma certa complacência com o vazio dos demais personagens. O capítulo do livro "Ninguém mais tem filhos hoje em dia" é muito interessante e contrasta ironicamente com o filho do casal de amigos. O humor esvazia a sutilidade e dramaticidade existente na história do livro.
E o filme fica na evidência desse mundo novo e se reluta com ele até o fim, sem possibilitar grandes reflexões além da evidência de que o mundo mudou muito, a juventude também. Mas como dizia Caio Fernando Abreu, um dos observadores mais agudos dessas mudanças contemporâneas, o que fazemos com essa coisa presa na garganta que a gente masca, masca e continua aqui, parada? Sobre isso o filme não tem nada a dizer, além de gargalhadas e pipocas. Deve ser por isso que a grande imprensa foi tão chatamente elogiosa.
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