2 de jun. de 2007

Jabor (já foi) contra a corrente

Opinião Publica de Arnaldo Jabor destoa do tom geral dos filmes sobre a ditadura militar. Sem menção explícita ao Estado autoritário, Jabor faz uma minuciosa colagem de cenas documentais de uma suposta "classe" da sociedade brasileira, a classe média.

Entrecortado entre os mais diversos embarços cotidianos, o que se monta é um quadro de decadência da sociedade brasileira, marcada pelo seu conservadorismo, machismo e suas pequenas violências cotidianas. Desde a mulher que faz um balanço negativo de sua vida, narrando a decadência material de sua casa e sua família, enquanto o marido vivia em "farras", até a vedete ensinando as meninas "recatadas" o que é o amor, encontramos uma sociedade convulsionada e decadente, muito diferente das cenas combativas que estamos acostumados a ver nas centenas de filmes que abordam a luta armada.

O filme de Jabor ilustra um pouco o povo que as organizações de esquerda nunca encontraram na sua luta. A partir do filme, fica mais evidente o grau de descolamento existente entre as expectativas desses grupos e o seu poder de recepção por uma sociedade que, se não era um espelho não menos podre da ditadura que os governava, tinha com esse governo muitas afinidades, expressas não na vida pública ou nas idéias políticas, mas na sua miséria privada.


Um documento precioso pela sua peculiaridade na filmografia da ditadura, o filme faz um contraponto com a hipertrofia existente nos filmes e livros, da força das lutas contra a ditadura militar no Brasil. Na época em que foi feito, em 1967, o filme poderia ter gerado repulsa ou vergonha. Hoje, certamente nos permite perceber uma certa continuidade com o período ditatorial, insistentemente visto como um hiato e não como uma constante na história brasileira. A continuidade com o período se expõe na precariedade da sociedade brasileira, sempre passível à crise, ao autoritarismo e à fome.

Com as lentes voltadas para o "povo", para a "opinião pública" ou para a "classe média" Jabor documenta uma sociedade brasileira cristalizada, muito atual, que insiste em desafiar as transformações institucionais que se realizaram desde a abertura política em 1979 com a anistia até a vitória de Lula para a presidência da república.

Fica um engasgo difícil de entender. Por que, diabos, o Brasil muda tanto e continua sempre igual, decadentemente igual na sua desigual ditadura econômica e social, pública e privada?



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